As Intermitências da Morte, de José Saramago

As Intermitências da Morte, de José Saramago
Editora: Companhia das Letras
ISBN: 9788535907254
Ano da Edição: 2005
Páginas: 208 
 No dia seguinte, ninguém morreu. É assim que começa a narrativa de José Saramago, contando sobre como a população de um determinado país reage diante de um evento que nunca havia acontecido: ninguém mais morre. Não importa se é uma doença terminal ou um grave acidente, não há uma pessoa sequer que tenha morrido desde a meia noite.

Mas... por que?

Essa é a mesma pergunta que os cidadãos logo começam a fazer, e cabe aos líderes e à Igreja responder. O problema é que eles, tão desinformados quanto os demais, não têm uma resposta para um acontecimento tão inesperado. Sem resposta, a população passa a ver a "vida eterna" na Terra como uma benção, um presente divino. O outro lado dessa mesma moeda é a crise da Igreja, pois "se não há morte, não há ressureição e, logo, não há Igreja". Mas as críticas à fragilidade do sistema não param por aí...

O governo, a princípio anestesiado pela onda de patriotismo que invade o país, também passa a encontrar graves problemas. A grande demanda nos hospitais, a população que tende a crescer em número alarmante e a crise no setor funerário e nas seguradoras: são essas as reais consequências das "férias" da morte.

Ao longo da narrativa as críticas são muito claras, mas colocadas de modo tão irônico que o livro em momento nenhum se torna cansativo. Foi o primeiro livro do Saramago que li e, sem dúvidas, acertei na escolha. Apesar de ter estranhado o estilo de escrita no começo (a falta de pontuações; os parágrafos e capítulos muito longos) aos poucos me acostumei e a narrativa, que fluiu tão bem, passou por cima de qualquer dificuldade em relação ao estilo do autor.

Os personagens não têm nome próprio. São "a rainha", "o bispo", "o ministro", entre outros. Em geral, o que tem nome são as instituições, como a Igreja, o Governo, a Imprensa e até mesmo a maphia, um grupo que mostra o quanto o Estado pode se submeter às ordens de pessoas que sejam mais ameaçadoras que eles mesmos. Tudo isso faz com que o livro seja uma crítica para a sociedade em geral, incluindo os indivíduos. É muito interessante ver como, a partir de um acontecimento sobrenatural, José Saramago mostra que a morte talvez não seja o pior inimigo, pelo contrário. Morrer, para muitos que estão sofrendo, é na verdade um grande alívio.

Na segunda metade do livro, a tão temida morte resolve aparecer. Dando algumas justificativas e fazendo algumas mudanças, ela se torna a protagonista pelo resto do livro. Estranhei um pouco na transição mas logo  acabei criando uma afeição pela personagem, não tão perversa como dizem por aí. O desfecho do livro me surpreendeu não por ser inesperado e grandioso, mas por ser tão simples e ao mesmo tempo impactante que concluiu a obra com maestria.

É um livro que faz pensar sobre vários aspectos da vida (e da morte) mas que não deixa de lado as reflexões religiosas e políticas, de um modo que nunca antes havia me atraído tanto. Com esse livro, Saramago me convenceu a ler todas as suas obras e o farei o mair rápido possível. É um tapa na cara de alguns, mas continua sendo um livro encantador e que eu recomendo a todos que se interessem pelo gênero ou simplesmente que se interessem pelo que José Saramago tem a dizer nas entrelinhas.

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